A palavra
No contexto do Sarau de poesia do nosso Agrupamento e sempre que os textos nos invadem, aparecem clareiras de sentido, revelações, à imagem da Carta de Lord Chandos.
Nas minhas arqueologias – sem qualquer pretensão ou inflação erudita ou pedante – descobri este texto que se impõe partilhá-lo com quem não o conheça. Por falta deste tesouro traduzido na nossa língua, bem ou mal, traduzi-o a partir do francês. É do chantre do amor universal, Rûmî (autor persa, sec. XIII).
Já falei demasiado…
“A palavra é como um sol que aquece e dá vida a todos os seres humanos. O sol está sempre perto, vivo e presente e aquece continuamente os humanos que, no entanto, não o remarcam e ignoram que é dele que vem o calor e a vida. Porém, se por intermédio de uma palavra ou de uma locução expressamos seja o agradecimento, seja a acusação, seja o bem ou o mal, então damo-nos conta que o sol, como simples astro do dia, que no entanto brilha sem fim, só o vemos quando os seus raios se reflectem contra uma parede. Do mesmo modo, os raios de sol da palavra só aparecem pelo intermediário das letras e dos sons. Ele está, no entanto, sempre presente porque o sol é uma presença subtil. E, para que uma presença subtil apareça e se faça ver, é necessário o intermediário de uma matéria densa. Por conseguinte, vimos que, quando chegares ao ponto em que possas ver este raio e esta subtileza sem o intermediário da densidade, e que tu te acostumes a essa prática, então tornar-te-ás audaz na contemplação, fortificar-te-ás e contemplando este mar imenso de subtilezas, verás cores extraordinárias e maravilhar-te-ás com coisas espantosas.”
Adriano Valadar 18.05.15